Mas desde que reconheci que
existe um Deus, ao mesmo tempo compreendi também que tudo o resto depende dele
e que ele não é enganador, e daí concluí que tudo o que concebo clara e
distintamente é necessariamente verdadeiro, mesmo que não atente nas razões pelas
quais julguei que isso era verdadeiro, mas apenas me recorde de o ter visto
clara e distintamente.
Por conseguinte, não se pode alegar em contrário nenhuma
razão que me leve a duvidar, mas tenho disso ciência verdadeira e certa.
Ciência certa e verdadeira, não apenas disso, mas também de todas as outras
coisas que me recordo de alguma vez ter demonstrado, como as da geometria e
semelhantes. Então, o que se me pode agora objetar? Talvez que sou feito de
tal modo que muitas vezes me engano? Mas já sei que não me posso enganar
daquilo que concebo com evidência. Talvez que tivesse como verdadeiras e certas
muitas outras coisas, que depois depreendi serem falsas? Mas eu não depreendera
clara e distintamente nenhuma delas, pois, ignorante desta regra da verdade,
acreditara-as talvez por outras causas que depois descobri serem menos firmes.
O que se me dirá ainda? Que possivelmente sonho, ou que todas as coisas que
agora penso não são mais verdadeiras do que as que me ocorrem quando durmo?
Ainda assim, isto não altera nada, porque, seguramente, mesmo que eu sonhasse,
se alguma coisa é evidente ao meu espírito, é absolutamente verdadeira.
E assim vejo perfeitamente que a
certeza e a verdade de toda a ciência dependem unicamente do conhecimento de
Deus verdadeiro, a tal ponto que, antes de o conhecer, eu não podia saber nada,
de modo perfeito, de qualquer outra coisa. Porém, agora podem ser perfeitamente
conhecidas e certas, para mim, inúmeras coisas, quer do próprio Deus e das
coisas intelectuais, quer também de toda a natureza corpórea, que é o objeto da
matemática pura.
Descartes, Meditações sobre a Filosofia Primeira
No terceiro nível da
dúvida, Descartes admite a existência de um Deus enganador. Porém, uma vez
provada a existência de Deus, como ser perfeito, é afastada essa hipótese, pois
“enganar” seria próprio de imperfeição.
O cogito deu a Descartes o critério para distinguir o verdadeiro do falso.
Assim, pode procurar outras ideias claras e distintas para descobrir outras verdades.
Mas, o que garante que não se engana quando concebe algo muito clara e distintamente? (O Deus maligno poderia fazer conceber clara e distintamente coisas erradas)
É necessária uma garantia do critério de clareza e distinção.
Só Deus pode garantir que não se engano quando pensa clara e distintamente.
Deus assume um papel
fundamental no sistema cartesiano porque vai garantir a verdade das ideias
inatas, do critério de verdade. Deus é garantia da validade das evidências e da
objetividade do conhecimento. As nossas faculdades de conhecimento foram
criadas por Deus, que não é enganador.
Também Deus é
garantia que a crença no mundo exterior é verdadeira. O facto de conceber de
forma clara e distinta que o mundo físico consiste na extensão e no movimento é
razão para não duvidar que o mundo exista.
Deus valida o
conhecimento humano. Deus garante a adequação entre o pensamento evidente e a realidade.
- No terceiro nível da dúvida, Descartes apresenta a hipótese de Deus enganador.
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A existência de Deus, como ser perfeito, afasta a existência de um
génio maligno e garante a verdade das ideias claras e distintas.
Deus valida o critério de verdade.
Deus permite chegar à certeza da existência do mundo exterior.
Deus valida o critério de verdade.
Deus permite chegar à certeza da existência do mundo exterior.
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A razão, bem conduzida, e apoiada pela
veracidade divina, pode conhecer toda a realidade.
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A objectividade do conhecimento é garantida pela
existência de um ser perfeito.
Adorei
ResponderEliminarUm espetáculo digo eu.
Muito bom mesmo. Obrigado!
ResponderEliminarMuito bom mesmo. Obrigado!
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