quarta-feira, 27 de março de 2013

O problema da previsão das consequências





Os defensores da utilidade também são frequentemente chamados a responder a objeções como esta – que antes da ação, não há tempo para calcular e pesar os efeitos de qualquer linha de conduta na felicidade geral. Isto é exactamente como se alguém dissesse que é impossível guiqr a nossa conduta pelo cristianismo, já que sempre que tenho de fazer alguma coisa, não há tempo para ler todo o Antigo e o Novo Testamento. A resposta à objeção é que tem havido muito tempo, nomeadamente todo o passado da espécie humana. Ao longo desse tempo, a humanidade tem vindo a descobrir as tendências das ações através da experiência, dependendo dessa experiência toda a prudência, bem como toda a moralidade da vida. As pessoas falam como se o começo desse curso de experiência tivesse sido posto de parte até aqui, e como se, no momento em que o homem se sente tentado a intrometer-se na propriedade ou na vida do outro, tivesse de começar a considerar pela primeira vez se o assassínio ou o roubo são prejudiciais para a felicidade humana. Penso que mesmo nesse caso ele não consideraria a questão muito enigmática, mas, seja como for, a questão hoje chegar-lhe-ia resolvida às mãos. É realmente estranho que, se os seres humanos tivessem concordado quanto a considerar a utilidade como o teste da moralidade, permaneceriam sem qualquer acordo sobre aquilo que é útil e não tomariam quaisquer medidas para que as suas noções sobre o assunto fossem ensinadas aos jovens e inculcadas pela lei e pela opinião.(…)

terça-feira, 26 de março de 2013

Teste Intermédio de Filosofia



Aproxima-se o teste intermédio de Filosofia...

A adesão ao teste intermédio de Filosofia não é consensual.

A oposição ao teste intermédio integra, entre outros, argumentos relativos à natureza dos exames e às limitações didáticas e pedagógicas decorrentes da existência de avaliação externa: os exames não são essenciais à aprendizagem e nem sempre constituem os instrumentos mais adequados e/ ou fiáveis para avaliar as competências adquiridas pelos alunos; o ensino da filosofia não pode limitar-se à preparação/ treino dos alunos para a realização de um exame; podemos motivar os alunos e desenvolver um bom trabalho sem a perspetiva de exame; o problema da fiabilidade intercorretores pode por (põe) em causa os seus resultados; o teste intermédio não é essencial para preparar os alunos para exame (sempre se fizeram exames sem testes intermédios); os testes intermédios constituem um limite ao exercício da autonomia científica e pedagógica dos professores/ grupos disciplinares nas escolas…
Ora, eu defendo claramente a existência do teste intermédio na sequência da existência do exame nacional (exame que deveria ser obrigatório). Integrado no processo de preparação para exame parece-me importante, tanto do ponto de vista do aluno, como do professor (há benefício para os alunos e para o professor experimentarem uma prova externa que antecipa o exame).
Mas a questão que me parece fundamental é que avaliação externa tem um papel importante, regulador da qualidade de ensino; ela supõe que se estabeleçam conteúdos programáticos, que se definam competências a desenvolver e a avaliar, para todos os alunos, independentemente da escola que frequentam ou do professor que lhes “calha”. O programa aberto aos percursos, perspetivas, opções e preferências de cada um propiciou uma ampla liberdade para dar as aulas ao “critério de cada um”. E este “ficar ao critério de cada um”, como sabemos, pode dar para o melhor ou para o pior...
A filosofia enquanto disciplina do ensino secundário precisa de se reabilitar, de ser reconhecida a sua importância curricular (com um estatuto equiparado às outras disciplinas consideradas estruturantes), enquanto disciplina que permite desenvolver a capacidade de argumentar e pensar criticamente.
É claro que o ensino da filosofia não se deve centrar/ esgotar na preparação dos alunos para o exame, daí a importância da concordância entre a seleção de conteúdos relevantes e das competências a desenvolver e a avaliar nas aulas e aquelas que são objeto dos exames.
.                                                                                            H.B.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Conhecimentos de facto e a relação de causalidade




Todos os raciocínios relativos aos factos parecem fundar-se na relação de causa e efeito. Só mediante esta relação podemos ir além do testemunho da nossa memória e dos nossos sentidos. Se perguntássemos a um homem porque acredita ele em alguma questão de facto  que está ausente, por exemplo, que o seu amigo está no campo ou na França, fornecer-nos-ia uma razão e esta razão seria algum outro facto, como uma carta dele recebida ou o conhecimento das suas antigas resoluções e promessas. Um homem que encontrasse um relógio ou qualquer outra máquina numa ilha deserta concluiria que noutros tempos estiveram homens nessa ilha. Todos os nossos raciocínios acerca de factos são da mesma natureza. E aqui supõe-se constantemente que existe uma conexão entre o facto presente e aquele que dele é inferido. Se nada houvesse a ligá-los, a inferência seria inteiramente precária. A audição de uma voz articulada e de discurso racional na escuridão certifica-nos da presença de alguma pessoa. Porquê? Porque são efeitos da maneira de ser e da estrutura humanas, e intimamente a elas adstritos. Se analisamos todos os outros raciocínios desta natureza, veremos que se baseiam na relação de causa e efeito, e que esta relação é próxima ou remota, directa ou colateral. O calor e a luz são efeitos colaterais do fogo, e um efeito pode ser adequadamente inferido a partir do outro.
                                                              David Hume, Investigação Sobre o Entendimento Humano



Não há nenhuma impressão sensível da qual derive a ideia de causa

Mas observamos:

-        A SUCESSÃO TEMPORAL

-       A CONJUNÇÃO CONSTANTE ENTRE DOIS FENÓMENOS E CHAMAMOS CAUSA AO QUE PRECEDE E EFEITO AO QUE SUCEDE

Ao observar que um acontecimento A tem até agora sido sempre seguido do acontecimento B, acreditamos que, da próxima vez que ocorrer A, sucederá B.

-  A OBSERVAÇÃO DESTA CONSTANTE CONJUGAÇÃO, LEVA-NOS A FORMAR A IDEIA DE CAUSA.

-      A IDEIA DE CAUSA NÃO DERIVA DA OBSERVAÇÃO DE UM FENÓMENO MAS DO COSTUME, DO HÁBITO DE ESPERAR QUE B ACONTEÇA MAL VEMOS A ACONTECER.


sexta-feira, 15 de março de 2013

Relações entre ideias e conhecimentos de facto







    Todos os objectos da razão ou investigação humanas podem naturalmente dividir-se em duas classes, a saber, Relações de Ideias e Questões de Facto. Do primeiro tipo são as ciências da Geometria, Álgebra e Aritmética e, em suma, toda a afirmação que é intuitiva ou demonstrativamente certa. Que o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos dois lados é uma proposição que exprime uma relação entre estas figuras. Que três vezes cinco é igual à metade de trinta expressa uma relação entre estes números. Proposições deste tipo podem descobrir-se pela simples operação do pensamento, sem dependência do que existe em alguma parte no universo. Ainda que nunca tivesse havido um círculo ou um triângulo na natureza, as verdades demonstradas por Euclides conservariam para sempre a sua certeza e evidência.
    As questões de facto, que constituem os segundos objectos da razão humana, não são indagadas da mesma maneira, nem a nossa evidência da sua verdade, por maior que seja, é de natureza semelhante à precedente. O contrário de toda a questão de facto é ainda possível, porque jamais pode implicar uma contradição, e é concebido pela mente com a mesma facilidade e nitidez, como se fosse idêntico à realidade. Que o Sol não se há-de levantar amanhã não é uma proposição menos inteligível e não implica maior contradição do que a afirmação de que ele se levantará. Por conseguinte, em vão tentaríamos demonstrar a sua falsidade.
                  David Hume, Investigação Sobre o Entendimento Humano



TIPOS DE CONHECIMENTO

  - As relações de ideias conhecimentos apriori que resultam da análise dos elementos de uma proposição     e do estabelecimento de relações entre as ideias que ela contém.

  A verdade das proposições que exprimem relações de ideias constituem conhecimentos que não dependem do confronto com a experiência

As relações de ideias são verdades necessárias: não é logicamente possível a sua negação

-  Os conhecimentos de questões de facto são a posteriori e a verdade destas proposições tem de ser testada pela experiência.

Impressões e ideias



Todos admitirão prontamente que há uma diferença considerável entre as percepções da mente quando uma pessoa sente a dor de um calor excessivo ou o prazer de uma tepidez moderada, e quando mais tarde traz à memória essa sensação ou a antecipa pela sua imaginação. Essas faculdades podem imitar ou copiar as perceções dos sentidos, mas jamais podem atingir toda a força e vivacidade do sentimento original. (…) Todas as cores da poesia, por mais esplêndidas que sejam, jamais serão capazes de retractar os objetos naturais de modo tal que se tome a descrição por uma paisagem real. O mais vivido pensamento será sempre inferior à mais ténue das sensações.



Podemos aqui, portanto, dividir todas as percepções da mente em duas classes ou espécies, que se distinguem pelos seus diferentes graus de força e vivacidade. As que são menos fortes e vividas são geralmente chamadas pensamentos ou ideias. A outra espécie carece de nome na nossa língua, bem como na maioria das outras, e suponho que isto acontece porque nunca foi necessário para qualquer finalidade, com exceção das de caráter filosófico, designá-las por qualquer termo ou denominação geral. Permitamo-nos portanto uma certa liberdade e chamemos-lhes impressões, empregando esta palavra num sentido um pouco diferente do habitual. Entendo pelo termo impressão, assim, todas as nossas impressões mais vividas, sempre que ouvimos, ou vemos, ou sentimos, ou amamos, ou odiamos, ou desejamos ou queremos. E as impressões são distintas das ideias, que são as percepções menos vividas de que temos consciência, quando reflectimos sobre qualquer das sensações ou movimentos acima mencionados.


A primeira vista, nada pode parecer mais ilimitado do que o pensamento humano, que não apenas escapa a toda autoridade e a todo poder do homem, mas também nem sempre é reprimido dentro dos limites da natureza e da realidade. Inventar monstros e juntar as mais incongruentes formas e aparências não custa à imaginação mais esforço do que conceber os  objetos mais naturais e familiares. E enquanto o corpo está confinado a um só planeta, sobre  o qual se arrasta com dor e dificuldade, o pensamento pode-nos transportar num instante às mais distantes regiões do universo, ou mesmo para além do universo, até ao caos ilimitado, onde se supõe que a Natureza jaz em total confusão. Aquilo que nunca se viu, ou de que nunca se ouviu falar,  pode ainda ser concebido; e nada há que fique fora do alcance do pensamento, exceto o que implicar absoluta contradição.

Mas embora o nosso pensamento pareça possuir essa liberdade ilimitada, vemos como um exame mais atento nos mostrará que ele realmente está confinado a limites muito estreitos, e que todo este poder criador da mente não é mais do que a capacidade compor, transpor, aumentar e diminuir os materiais que nos são fornecidos pelos sentidos e pela experiência. Quando pensamos numa montanha de ouro, estamos apenas a juntar duas ideias consistentes, a de ouro e a de montanha, as quais já conhecíamos anteriormente. Podemos conceber um cavalo virtuoso porque a partir dos nossos próprios sentimentos, podemos conceber a virtude, e depois uni-la à forma e à figura de um cavalo, animal que nos é familiar. Em suma, todos os materiais do pensamento derivam de nossas sensações externas ou internas. Apenas a mistura e composição deles compete à mente e à vontade. Ou, para me expressar em linguagem filosófica, todas as nossas ideias ou percepções mais fracas são cópias de nossas impressões ou percepções mais vivas.

                                             David Hume, Investigação sobre o Entendimento Humano

Conteúdos do Pensamento

          Os conteúdos da mente são as impressões e as ideias
          As impressões correspondem aos dados da experiência, referem-se às nossas sensações externas e aos nossos sentimentos.
          As ideias são as representações ou imagens debilitadas, enfraquecidas, das impressões.
          A diferença entre as impressões e as ideias é de grau e não de natureza; as ideias são cópias das impressões sensíveis.
          Para Hume não há ideias inatas 


segunda-feira, 11 de março de 2013

A escolha de Sofia






Uma mulher polaca, com os seus dois filhos é presa num campo de concentração de Auschwitz. Os nazis colocam-na perante um terrível dilema: um dos filhos pode ser poupado à câmara de gaz mas tem de ser ela a escolher. Obrigada, acaba por escolher.

A teoria utilitarista de Stuart Mill




"Assim, entre a felicidade pessoal e a felicidade dos outros, o Utilitarismo exige que o indivíduo que seja tão rigoroso e imparcial como um espectador desinteressado e de boa fé (...) fazer o que desejaríamos que nos fizessem, amar e respeitar o próximo como a nós mesmos, é isto que constitui a perfeição ideal da moral utilitarista."
                                                                          Stuart Mill, O Utilitarismo


A ética utilitarista de Stuart Mill é uma forma de consequencialismo.

As éticas consequencialistas consideram que as ações são moralmente corretas ou moralmente incorretas consoante as suas consequências. A ação deve escolher-se tendo em consideração as melhores consequências.

Para a teoria utilitarista de Stuart Mill, a felicidade é a finalidade última das ações humanas.

 O critério de moralidade é o princípio de utilidade: as ações são moralmente corretas se promoverem a felicidade ou o bem estar para o maior número de pessoas envolvidas.

Ao escolher uma ação deve ponderar-se as suas consequências de felicidade ou bem estar das pessoas afectadas. A felicidade é perspectivada de uma forma imparcial para todos os envolvidos (na escolha entre a felicidade do agente e a felicidade geral.


domingo, 10 de março de 2013

Imperativo categórico


Como muitos outros filósofos, Kant pensava que a moralidade pode resumir-se num princípio fundamental, a partir do qual se derivam todos os nossos deveres e obrigações. Chamou a este princípio «imperativo categórico». Na Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785) exprimiu-o desta forma:

Age apenas segundo aquela máxima que possas ao mesmo tempo desejar que se torne lei universal.
No entanto, Kant deu igualmente outra formulação do imperativo categórico. Mais adiante, na mesma obra, afirmou que se pode considerar que o princípio moral essencial afirma o seguinte:


Age de tal forma que trates a humanidade, na tua pessoa ou na pessoa de outrem, sempre como um fim e nunca apenas como um meio.


Os estudiosos têm-se perguntado desde então por que razão pensava Kant que estas duas regras são equivalentes. Parecem exprimir conceções morais diferentes. Serão, como Kant pensava aparentemente, duas versões da mesma ideia básica, ou são simplesmente ideias diferentes? Não nos vamos deter nesta questão. Vamos, em vez disso, concentrar-nos na crença de Kant de que a moralidade exige que tratemos as pessoas «sempre como um fim e nunca apenas como um meio». O que significa exatamente isto, e que razão há para pensar que é verdade?


Quando Kant afirmou que o valor dos seres humanos «está acima de qualquer preço» não tinha em mente apenas um efeito retórico, mas sim um juízo objetivo sobre o lugar dos seres humanos na ordem das coisas. Há dois factos importantes sobre as pessoas que apoiam, do seu ponto de vista, este juízo.


Primeiro, uma vez que as pessoas têm desejos e objetivos, as outras coisas têm valor para elas em relação aos seus projetos. As meras «coisas» (e isto inclui os animais que não são humanos, considerados por Kant incapazes de desejos e objetivos conscientes) têm valor apenas como meios para fins, sendo os fins humanos que lhes dão valor. Assim, se quisermos tornar-nos melhores jogadores de xadrez, um manual de xadrez terá valor para nós; mas para lá de tais objetivos o livro não tem valor. Ou, se quisermos viajar, um carro terá valor para nós; mas além de tal desejo o carro não tem valor.
Segundo, e ainda mais importante, os seres humanos têm «um valor intrínseco, isto é, dignidade», porque são agentes racionais, ou seja, agentes livres com capacidade para tomar as suas próprias decisões, estabelecer os seus próprios objetivos e guiar a sua conduta pela razão. Uma vez que a lei moral é a lei da razão, os seres racionais são a encarnação da lei moral em si. A única forma de a bondade moral poder existir é as criaturas racionais apreenderem o que devem fazer e, agindo a partir de um sentido de dever, fazê-lo. Isto, pensava Kant, é a única coisa com «valor moral». Assim, se não existissem seres racionais a dimensão moral do mundo simplesmente desapareceria.


Não faz sentido, portanto, encarar os seres racionais apenas como um tipo de coisa valiosa entre outras. Eles são os seres para quem as meras «coisa» têm valor, e são os seres cujas ações conscientes têm valor moral. Kant conclui, pois, que o seu valor tem de ser absoluto, e não comparável com o valor de qualquer outra coisa.


Se o seu valor está «acima de qualquer preço», segue-se que os seres racionais têm de ser tratados «sempre como um fim e nunca apenas como um meio». Isto significa, a um nível muito superficial, que temos o dever estrito de beneficência relativamente às outras pessoas: temos de lutar para promover o seu bem-estar; temos de respeitar os seus direitos, evitar fazer-lhes mal, e, em geral, «empenhar-nos, tanto quanto possível, em promover a realização dos fins dos outros».
Mas a ideia de Kant tem também uma implicação um tanto ou quanto mais profunda. Os seres de que estamos a falar são racionais, e «tratá-los como fins em si» significa respeitar a sua racionalidade. Assim, nunca podemos manipular as pessoas, ou usá-las, para alcançar os nossos objectivos, por melhores que esses objectivos possam ser. Kant dá o seguinte exemplo, semelhante a outro que utiliza para ilustrar a primeira versão do seu imperativo categórico: suponha que precisa de dinheiro e quer um empréstimo, mas sabe que não será capaz de devolvê-lo. Em desespero, pondera fazer uma falsa promessa de pagamento de maneira a levar um amigo a emprestar-lhe o dinheiro. Poderá fazer isso? Talvez precise do dinheiro para um propósito meritório — tão bom, na verdade, que poderia convencer-se a si mesmo de que a mentira seria justificada. No entanto, se mentisse ao seu amigo, estaria apenas a manipulá-lo e a usá-lo «como um meio».
Por outro lado, como seria tratar o seu amigo «como um fim»? Suponha que dizia a verdade, que precisava do dinheiro para um certo objetivo mas não seria capaz de devolvê-lo. O seu amigo poderia, então, tomar uma decisão sobre o empréstimo. Poderia exercer os seus próprios poderes racionais, consultar os seus próprios valores e desejos, e fazer uma escolha livre e autónoma. Se decidisse de facto emprestar o dinheiro para o objetivo declarado, estaria a escolher fazer seu esse objetivo. Dessa forma, o leitor não estaria a usá-lo como um meio para alcançar o seu objetivo, pois seria agora igualmente o objetivo dele. É isto que Kant queria dizer quando afirmou que «os seres racionais […] têm sempre de ser estimados simultaneamente como fins, isto é, somente como seres que têm de poder conter em si a finalidade da ação».


A conceção kantiana da dignidade humana não é fácil de entender; é provavelmente a noção mais difícil discutida neste livro. Precisamos de encontrar uma forma de tornar a ideia mais clara. Para isso, analisaremos com algum detalhe uma das suas aplicações mais importantes. Isto pode ser bem melhor do que uma discussão teórica árida. Kant pensava que se tomarmos a sério a ideia da dignidade humana seremos capazes de entender a prática da punição de crimes de uma forma nova e reveladora. O resto deste capítulo será dedicado a um exame deste exemplo.



                                                             James Rachels, Elementos da Filosofia Moral


A Fórmula da Lei Universal “Age apenas segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que se torne lei universal”
Esta fórmula do imperativo categórico serve para testar a correção moral das nossas máximas; se a máxima da nossa ação se pode tornar uma norma moral universal.
A Fórmula da Humanidade “Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de outrem, sempre e simultaneamente como fim e nunca apenas como meio”
Os seres humanos racionais têm um valor intrínseco absoluto, incondicional e devem, por isso, ser tomados como fins em si (pessoas) e nunca como simples meio.


Respeitar as pessoas significa trata-las como fins em si e nunca como como meros instrumentos que nos sirvam para atingir os nossos objectivos.
Tratar alguém como meio não é moralmente incorreto desde que respeitemos a sua vontade (estamos simultaneamente a trata-la como fim não como mero meio).

- Em que medida se relacionam as duas fórmulas do imperativo categórico?
- Qual a diferença entre tratar alguém como meio e mero meio?


A FÓRMULA DA LEI UNIVERSAL
“Age apenas segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que se torne lei universal”

 Uma ação é moralmente correta se a sua máxima (regra de ação que nos indica o motivo por que fazemos algo) puder ser universalizada, se se pode tornar um princípio universal de ação

A FÓRMULA DA HUMANIDADE
–“Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de outrem, sempre e simultaneamente como fim e nunca apenas como meio”

       Cada ser humano é um fim em si e nunca um simples meio (é moralmente errado instrumentalizar os outros usando-os como meros meios para atingir um objectivo)
       Os seres humanos, enquanto seres racionais, têm valor intrínseco absoluto (dignidade)
           Nenhum ser humano vale mais do que outro (pela condição de ser racional)

          Esta fórmula não proíbe as pessoas de serem meios umas para as outras, desde que sejam tratadas com respeito  e não apenas como meios,  ou tratadas como instrumentos ou objectos.

O imperativo categórico da ética deontológica de Kant

Imperativo categórico e imperativo hipotético



Objeções à ética deontológica de Kant


“Todos os imperativos ordenam ou hipotética ou categoricamente. Os hipotéticos representam a necessidade prática de uma ação possível como meio de alcançar qualquer coisa que se quer ou que é possível que se queira. O imperativo categórico é aquele que nos representa uma ação como ojetivamente necessária por si mesma, sem relação com qualquer outra finalidade. No caso da ação ser apenas boa como meio para qualquer outra coisa, o imperativo que ordena é hipotético; se a ação é boa em si, então o imperativo é categórico”
                                                                          Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes


- Distinga imperativo categórico de imperativo hipotético.
- Apresente um exemplo de imperativo categórico e de imperativo hipotético.



Imperativo Categórico
Imperativo Hipotético
-   Ordena que uma ação seja realizada pelo seu valor intrínseco.
-      Ordena que se cumpra o dever sempre por dever, ou seja, ordena que a vontade cumpra o dever exclusivamente motivada pelo que é correcto fazer.
-    Ordena que se aja por dever.
-   Ordena que sejamos imparciais e desinteressados, agindo segundo máximas que todos podem adotar.
-    Ordena que respeitemos o valor absoluto de cada ser racional nunca o reduzindo à condição de meio que nos é útil.
-         O cumprimento do dever é uma ordem condicionada pelo que de satisfatório ou proveitoso pode resultar do seu cumprimento.
-         As ações que nele se baseiam são ações conformes ao dever, feitas a pensar nas consequências ou resultados de fazer o que é devido.
-         As ações que cumprem o dever baseadas em interesses seguem máximas que não podem ser universalizadas.
-         As ações conformes ao dever não respeitam absolutamente o que somos enquanto seres humanos

10º B
11ºA (revisão para o teste intermédio)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Ética deontológica de Kant



 " Duas coisas enchem o meu coração de admiração: o céu estrelado por cima de mim e a lei moral em mim" (Kant, Crítica da Razão Prática) 

Kant: o valor moral de uma ação deriva da sua máxima, e não das suas consequências.

Cada ação pode ser descrita como uma ação de um certo tipo. Se ajudas alguém, podes conceber o que fazes como um ato de caridade. Neste caso, ages segundo a máxima de que deves ajudar os outros. Mas tens outras alternativas: quando forneces a ajuda talvez estejas a pensar que essa é uma maneira de fazer o beneficiário sentir-se em dívida para contigo. Neste caso, a máxima da tua ação pode ser a de que deves fazer que os outros se sintam em dívida para contigo. Para saberes que valor moral tem a tua ação, vê que máxima te levou a fazer o que fizeste.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Deus: Provas para Quê?

Filosofia da Mente



O jovem conferencista, José Gusmão, apresentou hoje, na nossa escola, uma excelente comunicação intitulada – Como Entendemos as Pessoas - que suscitou o interesse e envolvimento dos alunos presentes.
(José Gusmão é aluno do 2º ano da licenciatura de Filosofia da Faculdade de Letras. Participou, ainda no ensino secundário (Escola Secundária D. Amália, em Lisboa) nas Olimpíadas Internacionais de Filosofia, em Oslo, tendo obtido a medalha de prata. É, apenas com 19 anos, membro do grupo de investigação Lancog ((Language, Mind and Cognition). A sua área de investigação e futura especialização é A Filosofia da Mente.)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Relativismo cultural



Ana Relativista

“Fui educada para acreditar que a moral se refere a factos objectivos. Tal como a neve é branca, também o infanticídio é um mal. Mas as atitudes variam em função do espaço e do tempo. As normas que aprendi são as normas da minha própria sociedade; outras sociedades possuem diferentes normas. A moral é uma construção social. Tal como as sociedades criam diversos estilos culinários e de vestuário, também criam códigos morais distintos. [... ]
Considere a minha crença de que o infanticídio é um mal. Ensinaram-me isto como se se tratasse de um padrão objectivo. Mas não é; é apenas aquilo que defende a sociedade a que pertenço. Quando afirmo «o infanticídio e um mal» quero dizer que a minha sociedade desaprova essa prática e nada mais. Para os antigos romanos, por exemplo, o infanticídio era um bem. Não tem sentido perguntar qual das perspectivas é «correcta». Cada um dos pontos de vista é relativo à sua cultura, e o nosso é relativo à nossa. Não existem verdades objectivas acerca do bem ou do mal. [... ] «Mal» é um termo relativo. Deixem-me explicar o que isto significa. Quero dizer que nada está absolutamente «à esquerda», mas apenas «à esquerda deste ou daquele» objecto. Do mesmo modo, nada e um mal em absoluto, mas apenas um mal nesta ou naquela sociedade em particular. [... ]
Podemos expressar esta perspectiva claramente através de uma definição: «x e um bem» significa «a maioria (na sociedade em questão) aprova x». Outros conceitos morais como «mal» ou «correcto» podem ser definidos da mesma forma. Note-se ainda a referência a uma sociedade especifica. Excepto se o contrário for especificado, a sociedade em causa e aquela a que pertence a pessoa que faz juízo. Quando afirmo «Hitler agiu erradamente» quero dizer de acordo com os padrões da minha sociedade».
o mito da objectividade afirma que as coisas podem ser um bem ou um mal de uma forma absoluta e não relativamente a esta ou àquela cultura. Mas como poderemos saber o que é um bem ou o que é um mal em termos absolutos? Como poderíamos argumentar a favor desta ideia sem pressupor os padrões da nossa   sociedade?
As pessoas que falam do bem e do mal de forma absoluta consideram as normas que lhes foram ensinadas como factos objectivos. Essas pessoas necessitam de estudar antropologia, ou de viver algum tempo numa cultura diferente.
Quando adoptei o relativismo cultural tomei-me mais receptiva a aceitar outras culturas. Como muitos outros estudantes, eu partilhava a típica atitude «nós estamos certos e eles errados». Lutei arduamente contra isto. Apercebi-me de que o outro lado não está errado» mas que é apenas «diferente». Temos, por isso, que considerar  os outros a partir do seu próprio ponto de vista; ao critica-los, limitamo-nos a impor-lhes padrões que a nossa própria sociedade construiu. Nós, os relativistas culturais, somos mais tolerantes.”

          HARRY GENSLER, Introdução à Ética

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Critérios Valorativos



Os valores justificam as nossas escolhas e preferências, relativamente aos atos e aos objetos. Os valores estão na base das nossas escolhas.

Dilema moral:
          Lawrence Kohlberg
I
Numa cidade da Europa, uma mulher estava a morrer de cancro. Um medicamento descoberto recentemente por um farmacêutico dessa cidade podia salvar-lhe a vida. A descoberta desse medicamento tinha custado muito dinheiro ao farmacêutico, que agora pedia dez vezes mais por uma pequena porção desse remédio. Heinz, o marido da mulher que estava a morrer, foi ter com as pessoas suas conhecidas para lhe emprestarem o dinheiro pedido pelo farmacêutico. Foi ter, então com ele, contou-lhe que a sua mulher estava a morrer e pediu-lhe para o deixar levar o medicamento mais barato. Em alternativa, pediu-lhe para o deixar levar o medicamento, pagando mais tarde a metade do dinheiro que ainda lhe faltava. O farmacêutico respondeu que não, que tinha descoberto o medicamento e que queria ganhar dinheiro com a sua descoberta. Heinz, que tinha feito tudo ao seu alcance para comprar o medicamento, ficou desesperado e pensou assaltar a farmácia e roubar o medicamento para a sua mulher.
-         Deve Heinz assaltar a farmácia para roubar o medicamento para salvar a sua mulher?
II
Supondo que Heinz assaltava a Farmácia. A notícia do roubo aparecia no jornal. Brown, um polícia que conhecia Heinz, leu a notícia e lembrou-se de o ter visto a sair correndo da tal Farmácia. Como era amigo de Heinz, e conhecendo o seu caso, perguntou a si mesmo se deveria denunciá-lo.
-         Deve o polícia acusar Heinz de roubo?

III
Supondo que Brown prendia Heinz, este é levado a tribunal e compete agora ao Juiz determinar qual a sua sentença.
-         Deve o Juiz condenar Heinz ou suspender a pena e libertá-lo?
-         Que valores estão em conflito?

sábado, 5 de janeiro de 2013

Libertismo


O argumento da responsabilidade. O pressuposto de que temos livre-arbítrio está profundamente enraizado nas nossas formas habituais de pensar. Ao reagir a outras pessoas, não conseguimos deixar de as ver como autoras das suas ações. Consideramo-las responsáveis, censurando-as caso se tenham comportado mal e admirando-as caso se tenham comportado bem. Para que estas reações estejam justificadas, parece necessário que as pessoas tenham livre –arbítrio.

Outros sentimentos humanos importantes, como o orgulho e a vergonha, também pressupõem o livre-arbítrio. Alguém que conquista uma vitória ou tem sucesso num exame pode sentir-se orgulhoso, enquanto alguém que desiste ou faz batota pode sentir-se envergonhado. Porém, se as nossas acções se devem sempre a factores que não controlamos, os sentimentos de orgulho e de vaidade são infundados. Estes sentimentos são uma parte inescapável da vida humana. Assim, uma vez mais, parece inescapável que nos concebamos como livres.
Podemos, portanto, raciocinar desta forma:


1. Não conseguimos deixar de admirar ou de censurar as pessoas pelo que fazem, nem conseguimos deixar de, por vezes, sentir orgulho ou vergonha pelo que fazemos.


2. Estas reações – admiração, censura, orgulho e vergonha – não seriam apropriadas se as pessoas não tivessem livre-arbítrio.
3. Logo, temos de acreditar que as pessoas têm livre-arbítrio.


4. Dado que temos de ter essa crença, temo-la de facto: as pessoas têm livre-arbítrio.


Este é um exemplo daquilo que Immanuel Kant (1724-1804) designou por «argumento transcendental». Kant, que muitos consideram o maior dos filósofos modernos, observou que não conseguimos deixar de acreditar em certas coisas. Sendo assim, não conseguimos deixar de acreditar também naquilo que é necessário para que essas crenças sejam verdadeiras. Suponha-se que não conseguimos deixar de acreditar que X. Mas X pressupõe Y. Logo, disse Kant, não temos escolha: temos de presumir que é verdade que Y.
O problema dos argumentos deste tipo é óbvio. As crenças originais podem ser falsas, ainda que sejam psicologicamente inescapáveis. Se soubéssemos que as crenças originais são verdadeira – que as pessoas são censuráveis e que o orgulho é justificado - , poderíamos concluir que tudo o que essas crenças implicam também é verdade. Contudo, se não sabemos se as crenças são verdadeiras, não podemos extrair justificadamente quaisquer conclusões a partir delas. Não podemos concluir que temos livre-arbítrio a partir do simples facto de o livre-arbítrio ser implicado por crenças que temos, mas que não constituem conhecimento.


                                        James Rachels, Elementos da Filosofia Moral

Os fenómenos físicos são determinados mas as ações humanas resultam de deliberações racionais e podem alterar o curso dos acontecimentos do mundo

  •  Nem todos os acontecimentos estão submetidos ao mesmo tipo de causalidade
  •  A causalidade natural rege o mundo físico
  • Os agentes humanos são causa de ações que produzem efeitos no mundo
  • A causalidade livre é própria de algumas ações dos seres humanos
  • As ações não são o desfecho inevitável de ações anteriores
  • Se há ações livres, os agentes humanos  são responsabilizáveis por elas

Assim sendo, o determinismo é falso e a crença na liberdade e na responsabilidade é verdadeira



OBJEÇÕES
·         As deliberações e escolhas podem ser determinadas por desejos e crenças
·         Para o libertismo o livre arbítrio é incompatível com o determinismo
·         As escolhas não são livres
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