terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Ações por dever e ações em conformidade com o dever





“É na verdade conforme ao dever que o merceeiro não suba os preços ao comprador inexperiente (...) Mantém um preço fixo geral para toda a gente, de forma que uma criança pode comprar na sua mercearia tão bem como qualquer outra pessoa. É-se, pois, servido honradamente; mas isso ainda não é bastante para acreditar que o comerciante tenha assim procedido por dever e princípios de honradez; o seu interesse assim o exigia. A acção não foi, portanto, praticada (...) por dever, mas somente com intenção egoísta. (...)
Pelo contrário, conservar cada qual a sua vida é um dever, e é além disso uma coisa para que toda a gente tem inclinação imediata. Mas por isso mesmo é que o cuidado que a maioria dos Homens lhe dedica não tem nenhum valor intrínseco e a máxima que o exprime nenhum conteúdo moral. Os Homens conservam, habitualmente, a sua vida, conforme ao dever, sem dúvida, mas não por dever. Em contraposição, quando as contrariedades e o desgosto sem esperança roubaram totalmente o gosto de viver; quando o infeliz (…) deseja a morte e contudo conserva a vida sem a amar, não por inclinação ou medo, mas por dever, então a sua máxima tem conteúdo moral.”                                                                   
                                                                     Kant, Fundamentação da metafísica dos Costumes


A acção boa será a que respeita as normas? Qual a distinção entre legalidade e moralidade?

O que são acções em conformidade com o dever e acções por dever?

A Teoria Deontológica de Kant



A Fundamentação da moral





De todas as coisas que podemos conceber neste mundo ou mesmo, de uma maneira geral, fora dele, não há nenhuma que possa ser considerada como boa sem restrição, salvo uma boa vontade. O entendimento, o espírito, o juízo e os outros talentos do espírito, seja qual for o nome que lhes dermos, a coragem, a decisão, a perseverança nos propósitos, como qualidades do temperamento, são, indubitávelmente, sob muitos aspectos, coisas boas e desejáveis; contudo, também podem chegar a ser extrordináriamente más e daninhas se a vontade que há-de usar destes bens naturais, e cuja constituição se chama por isso carácter, não é uma boa vontade. O mesmo se pode dizer dos dons da fortuna. O poder, a riqueza, a consideração, a própria saúde e tudo o que constitui o bem-estar e contentamento com a própria sorte, numa palavra, tudo o que se denomina felicidade, geram uma confiança que muitas vezes se torna arrogância, se não existir uma boa vontade que modere a influência que a felicidade pode exercer sobre a sensibilidade e que corrija o princípio da nossa actividade, tornando-o útil ao bem geral; acrescentemos que num espectador imparcial e dotado de razão, testemunha da felicidade ininterrupta de uma pessoa que não ostente o menor traço de uma vontade pura e boa, nunca encontrará nesse espectáculo uma satisfação verdadeira, de tal modo a boa vontade parece ser a condição indispensável sem a qual não somos dignos de ser felizes.
(...) A boa vontade não é boa pelo que produz e realiza, nem por facilitar o alcance de um fim que nos proponhamos, mas apenas pelo querer mesmo; isto quer dizer que ela é boa em si e que, considerada em si mesma, deve ser tida em preço infinitamente mais elevado que tudo quanto possa realizar-se por seu intermédio em proveito de alguma inclinação, ou mesmo, se se quiser, do conjunto de todas as inclinações.

Emmanuel Kant,  Fundamentação da Metafísica dos Costumes

- O que é a boa vontade?

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Visita de Estudo







No dia 16 de Fevereiro a turma realizou uma visita de estudo ao Museu Nacional de Teatro e à Assembleia da República, no âmbito das Disciplinas de Formação Cívica, Português e Filosofia.


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A dúvida metódica e o acesso à verdade




(...) Mas, porque agora desejava dedicar-me apenas à procura da verdade, pensei que era forçoso que eu fizesse exactamente ao contrário e rejeitasse, como absolutamente falso, tudo aquilo em que pudesse imaginar a menor dúvida, a fim de ver se, depois disso, não ficaria alguma coisa na minha crença a, que fosse inteiramente indubitável. Assim, porque os nossos sentidos nos enganam algumas vezes, quis supor que não existe coisa alguma que seja tal como eles a fazem imaginar. E porque há homens que se enganam ao raciocinar, mesmo a propósito dos mais simples temas de geometria, e neles cometem paralogismos, ao considerar que eu estava sujeito a enganar-me, como qualquer outro, rejeitei como falsas todas as razões de que anteriormente me servira nas demonstrações. Finalmente, considerando que todos os pensamentos que temos no estado de vigília nos podem também ocorrer quando dormimos, sem que, neste caso, algum seja verdadeiro, resolvi supor que todas as coisas que até então tinham entrado no meu espírito não eram mais verdadeiras do que as ilusões dos meus sonhos. Mas, logo a seguir, notei que, enquanto assim queria pensar que tudo era falso, era de todo necessário que eu, que o pensava, fosse alguma coisa. E notando que esta verdade: penso, logo, existo, era tão firme e tão certa que todas as extravagantes suposições dos cépticos não eram capazes de a abalar, julguei que a podia aceitar, sem escrúpulo, para primeiro princípio da filosofia que procurava.
                                                                                                      Descartes, Discurso do Método



Descartes procura encontrar um fundamento do conhecimento seguro. Para isso recorre à dúvida como método – dúvida metódica -, tomando como falsas todas as nossas crenças acerca das quais se possa levantar a mais pequena dúvida, para ver se há crenças que resistam à dúvida, que se imponham como indubitáveis (das quais não se possa duvidar).
O recurso à dúvida é um meio para chegar à certeza.

Níveis de aplicação da dúvida:

Os sentidos não são completamente fiáveis
Os sentidos enganam-nos algumas vezes, devemos considerar que nos enganam sempre – dúvida hiperbólica

O mundo físico é uma ilusão – argumento do sonho (dúvida das crenças a priori)
Não podemos distinguir de forma segura as experiências do sono da vigília.
É possível que estejamos a sonhar quando pensamos estar acordados.
É possível que tudo o que observamos seja ilusão.

As crenças a priori podem ser falsas – argumento do génio maligno

“E tendo notado que, no Eu penso, logo existo, não há nada que me garanta que digo a verdade a não ser que vejo muito claramente que, para pensar é preciso existir, julguei que podia tomar como regra geral que as coisas que concebemos muito clara e distintamente são todas verdadeiras, havendo apenas alguma dificuldade em notar bem as que concebemos distintamente. (…)”

                                                                                           Descartes, Discurso do Método



O nosso entendimento pode confundir o verdadeiro com o falso. Mesmo as crenças a priori podem ser falsas, como as que temos no campo da matemática. Uma espécie de deus enganador pode fazer-nos viver uma ilusão.

A dúvida pôs em causa as crenças a priori e a posteriori. Será que tudo é falso?
Há uma certeza que resiste à dúvida. Ainda, Descartes afirma que, ainda que tudo seja falso, é um facto que se encontra a duvidar e que, está, portanto, a pensar. E, se está a pensar, existe como ser pensante.
Assim, a primeira certeza inabalável é o cógito, a crença “penso, logo existo”

O cógito é uma crença básica ou fundacional porque constitui um ponto de partida seguro para o conhecimento.
Mas o que é que torna indubitável a crença de que o cógito existe? Esta certeza não se atinge por meio do raciocínio nem se infere de qualquer outra coisa. A certeza do cógito é dada por intuição racional, uma evidência que se impõe ao espírito como clara e distinta. O cógito é uma ideia clara e distinta.
Assim, encontra Descartes o critério de verdade: clareza e distinção.

Assim o método permite a descoberta:
1-      Do cógito como primeira certeza, como crença fundacional
2-      Do critério de verdade – clareza e distinção, que permite distinguir as ideias verdadeiras das falsas.


Descartes

Cogito

Descartes recorreu a argumentos cépticos como um instrumento para chegar ao conhecimento seguro. Apesar de o fazer, Descartes não é um céptico. Vejamos, por exemplo, o argumento do sonho e o argumento do génio maligno. No primeiro, Descartes defende que não é possível fazer a distinção entre estar acordado e estar a sonhar, porque podes sonhar que estás a fazer um teste para te certificares de que estás acordado. No segundo, a suposição de um génio maligno bastante poderoso que se empenha em enganar-te mesmo quando acreditas que 2 + 2 = 4, leva-te a suspender o juízo em relação às verdades lógicas e matemáticas, por mais simples que sejam. Mas por mais que tentes duvidar da tua existência, supondo que estás apenas a sonhar ou a ser enganado por um génio maligno que te leva a pensar que existes, terás nesse momento a certeza de que alguma coisa existe para que ocorra a actividade de duvidar. Terá de haver um sonhador para sonhar a sua própria existência e um enganado para ser enganado. Descartes conclui que, enquanto pensar que está a ser enganado por um génio maligno, terá de existir como ser pensante. Trata-se do famoso cogito ergo sum (penso; logo, existo).
Através de argumentação a priori, Descartes obteve conhecimento acerca de algo que realmente existe: ele próprio como ser pensante. Para compreenderes melhor o que garante este conhecimento teremos de analisar a certeza implicada pelas crenças "Estou a pensar" e "Existo". Em primeiro lugar, ambas são incorrigíveis, o que se define do seguinte modo: se alguém acredita que está a pensar ou que existe, então não pode estar errado. Em segundo lugar, têm a propriedade de ser auto-verificáveis, a qual contribui para a incorrigibilidade e se define do seguinte modo: se alguém afirma estas proposições, então essa afirmação é verdadeira.
Vejamos melhor o que isto quer dizer. Considera a proposição expressa pela frase P: "Estou a pensar". Se pensares que P é falsa, exprimes nesse momento uma contradição. Mas não se trata de uma contradição lógica porque "Eu não estou a pensar" e "Eu não existo" não são falsas em todas as circunstâncias possíveis devido à sua forma lógica, como acontece com a proposição expressa pela frase "O mar tem peixes e o mar não tem peixes"; como é óbvio, em estados do mundo em que eu não existisse, aquelas proposições seriam verdadeiras. As negações de "Estou a pensar" e de "Existo" derrotam-se a si próprias do ponto de vista pragmático, auto-falsificam-se no preciso momento em que são ditas, e não devido à sua forma lógica; podemos compará-las à proposição expressa pela frase "Estou ausente" dita por ti quando o teu professor de filosofia faz a chamada. Assim, sempre que alguém diz ou mentalmente concebe "Estou a pensar" e "Existo", as proposições expressas por estas frases terão de ser verdadeiras. Mas estas não são verdades lógicas como "Chove ou não chove" ou verdades analíticas como "Nenhum solteiro é casado"; são verdades pragmáticas, as quais se definem por se auto-falsificarem quando alguém afirma a sua negação.
(...)
                            Faustino Vaz, in  http://criticanarede.com/hist_descarteshume.html






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