sábado, 16 de outubro de 2010

A ALEGORIA DA CAVERNA E A CONDIÇÃO HUMANA


Imagem tirada do Blog:http:
//hermes-embuscadesophia.blogspot.com/2008/07/o-significado-filosfico-da-alegoria-da.html

A ALEGORIA DA CAVERNA
Sócrates – Agora imagina a maneira como segue o estado da nossa natureza relativamente à instrução e à ignorância. Imagina homens numa morada subterrânea, em forma de caverna, com uma entrada aberta à luz; esses homens estão aí desde a infância, de pernas e pescoço acorrentados, de modo que não podem mexer-se nem ver senão o que está diante deles, pois as correntes os impedem de voltar a cabeça; a luz chega-lhes de uma fogueira acesa numa colina que se ergue por detrás deles; entre o fogo e os prisioneiros passa uma estrada ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está construído um pequeno muro, semelhante às divisórias que os apresentadores dos “robertos” armam diante de si e por cima das quais exibem as suas maravilhas.
Glauco – Estou vendo.
Sócrates – Imagina agora, ao longo desse muro, homens que transportam objectos de toda espécie, que o ultrapassam: estatuetas de homens e animais, de pedra, madeira e toda espécie de matéria; naturalmente, entre esses transportadores, uns falam e outros seguem em silêncio.
Glauco – Um quadro estranho e estranhos prisioneiros.
Sócrates – Assemelham-se a nós. E, para começar, achas que, numa tal condição, eles tenham alguma vez visto, de si mesmos e dos seus companheiros, mais do que as sombras projectadas pelo fogo na parede da caverna que lhes fica de fronte?

Glauco – Como, se são obrigados a ficar de cabeça imóvel durante toda a vida?
Sócrates – E com as coisas que desfilam? Não se passa o mesmo?
Glauco – Sem dúvida.
Sócrates – Portanto, se pudessem comunicar uns com os outros, não achas que tomariam por objectos reais as sombras que veriam?
Glauco – É bem possível.
Sócrates – E se a parede do fundo da prisão provocasse eco, sempre que um dos transportadores falasse, não julgariam ouvir a sombra que passasse diante deles?
Glauco – Sim, por Zeus!
Sócrates – Dessa forma, tais homens não atribuirão realidade senão às sombras dos objectos fabricados.
Glauco – Assim terá de ser.
Sócrates – Considera agora o que lhes acontecerá, naturalmente, se forem libertados das suas cadeias e curados da sua ignorância. Que se liberte um desses prisioneiros, que seja ele obrigado a endireitar-se imediatamente, a voltar o pescoço, a caminhar, a erguer os olhos para a luz: ao fazer todos estes movimentos sofrerá, e o deslumbramento impedi-lo-á de distinguir os objectos de que antes via as sombras. Que achas que responderá se alguém lhe vier dizer que não viu até então senão coisas vãs, mas que agora, mais perto da realidade e voltado para objectos mais reais, vê com mais justeza? Se, enfim, mostrando-lhe cada uma das coisas que passam, o obrigar, à força de perguntas, a dizer o que é? Não achas que ficará embaraçado e que as sombras que via outrora lhe parecerão mais verdadeiras do que os objectos que lhe mostram agora?
Glauco – Muito mais verdadeiras.
Sócrates – E se o forçarem a fixar a luz, os seus olhos não ficarão magoados? Não desviará ele a vista para voltar às coisas que pode fitar e não acreditará que estas são realmente mais distintas do que as que se lhe mostram?
Glauco – Com toda a certeza.
Sócrates – E se o arrancarem à força da sua caverna, o obrigarem a subir a encosta rude e escarpada e não o largarem antes de o terem arrastado até a luz do Sol, não sofrerá vivamente e não se queixará de tais violências? E, quando tiver chegado à luz, poderá, com os olhos ofuscados pelo seu brilho, distinguir uma só das coisas que ora denominamos verdadeiras?
Glauco – Não o conseguirá, pelo menos de início.
Sócrates – Terá, creio eu, necessidade de se habituar a ver os objectos da região superior. Começará por distinguir mais facilmente as sombras; em seguida, as imagens dos homens e dos outros objectos que se reflectem nas águas; por último, os próprios objectos. Depois disso, poderá, enfrentando a claridade dos astros e da Lua, contemplar mais facilmente, durante a noite, os corpos celestes e o próprio céu do que, durante o dia, o Sol e a sua luz.
Glauco – Sem dúvida.
Sócrates – Por fim, suponho eu, será o Sol, e não as suas imagens reflectidas nas águas ou em qualquer outra coisa, mas o próprio Sol, no seu verdadeiro lugar, que poderá ver e contemplar tal como é.
Glauco – Necessariamente.
Sócrates – Depois disso, poderá concluir, a respeito do Sol, que é ele que faz as estações e os anos, que governa tudo no mundo visível e que, de certa maneira, é a causa de tudo o que ele via com os seus companheiros, na caverna.
Glauco – É evidente que chegará a essa conclusão.
Sócrates – Ora, lembrando-se da sua primeira morada, da sabedoria que aí se professa e daqueles que aí foram seus companheiros de cativeiro, não achas que se alegrará com a mudança e lamentará os que lá ficaram?
Glauco – Sim, com certeza, Sócrates.
Sócrates – E se então distribuíssem honras e louvores, se tivessem recompensas para aquele que se apercebesse, com o olhar mais vivo, da passagem das sombras, que melhor se recordasse das que costumavam chegar em primeiro ou em último lugar, ou virem juntas, e que por isso era o mais hábil em adivinhar a sua aparição, e que provocasse a inveja daqueles que, entre os prisioneiros, são venerados e poderosos? Ou então, como o herói de Homero, não preferirá mil vezes ser um simples criado de charrua, a serviço de um pobre lavrador, e sofrer tudo no mundo, a voltar às antigas ilusões e viver como vivia?
Glauco – Sou da tua opinião. Preferirá sofrer tudo a ter de viver dessa maneira.
Sócrates – Imagina ainda que esse homem volta à caverna e vai sentar-se no seu antigo lugar: não ficará com os olhos cegos pelas trevas ao se afastar bruscamente da luz do Sol?
Glauco – Por certo que sim.
Sócrates – E se tiver de entrar de novo em competição com os prisioneiros que não se libertaram de suas correntes, para julgar essas sombras, estando ainda sua vista confusa e antes que os seus olhos se tenham recomposto, pois habituar-se à escuridão exigirá um tempo bastante longo, não fará que os outros se riam à sua custa e digam que, tendo ido lá acima, voltou com a vista estragada, pelo que não vale a pena tentar subir até lá? E se a alguém tentar libertar e conduzir para o alto, esse alguém não o mataria, se pudesse fazê-lo?
Glauco – Sem nenhuma dúvida.


                                                                                            Platão, República


·         Viagem que, do fundo escuro da caverna, conduz em direção à luz.
·        
o   O hábito de não pensar criticamente deixa-nos na escuridão
o   Essa viagem em direção à luz faz-nos questionar as nossas crenças básicas, que nos parecem inquestionáveis
o   Questionar as nossas crenças básicas exige pensamento crítico

o   Questionar as crenças básicas enfrenta a incompreensão dos outros.



Questões filosóficas na Alegoria da Caverna
  •        A filosofia é pensamento crítico: fica à nossa escolha aceitarmos passivamente o que nos é dado (o costume, os preconceitos…) e o hábito de não pensar, ou questionarmos as nossas crenças
  •      O conhecimento não é opinião (mesmo que seja defendida por muitos)
  •      Distinção entre aparência e a realidade
  •    Questões éticas: o prisioneiro que se conseguiu libertar da ilusão e dos preconceitos sentiu necessidade de voltar à caverna para libertar os companheiros da ignorância. Será que ele tinha essa obrigação moral? O que são deveres morais?




Qual é o tema do texto?

 A condição humana e o modo como se desenrola a sua existência


Problema:

Vivendo os seres humanos comuns aprisionados à sua própria ignorância como libertar-se dela e aceder ao conhecimento?


Tese:

O que é próprio da autêntica condição humana não é a ignorância mas o conhecimento.



Na primeira parte Platão descreve o mundo sensível e a situação dos homens que nele se encontram, só vendo as sombras dos objectos reflectidos na parede da caverna. Os prisioneiros representam a maior parte da humanidade no estado de eikasia, agrilhoados ao corpo e as suas, paixões, vendo apenas sombras e ouvindo os ecos da realidade.

Na segunda parte, um dos prisioneiros consegue libertar-se, acostumando-se progressivamente a luz do mundo exterior, até ser capaz de contemplar os objectos concretos, dos quais anteriormente, apenas vira as sombras. Este homem realizou uma autêntica conversão do mundo das sombras para o  mundo das realidades inteligíveis, acabando por contemplar o próprio Sol que simboliza a ideia Suprema, a ideia de Bem«causa universal de todas as coisas boas e belas... fonte da verdade e da razão» (República).

Na terceira parte, depois de ter ascendido a verdadeira realidade, contemplado o Sol, o homem ao regressar a caverna e incapaz de se adaptar a obscuridade. Se pretender libertar algum dos outros prisioneiros, para a luz, estes, que consideram o mundo das sombras a verdadeira realidade, matá-lo-iam. Platão faz aqui uma alusão a figura de Sócrates.
A Paideia platónica manifesta-se nesta ascensão do homem, do sensível para o inte1igivel, permitindo-lhe a contemplação das verdades eternas, universais e absolutas, ao liberta-lo da persuasão, do erro, da opinião sensível.
o Mundo Inteligível, simbolizado pelos objectos reais, atingidos no exterior da caverna, e o mundo da realidade verdadeira, imutável e eterna. As realidades que povoam este mundo inteligível são as ideias ou formasligadas entre si por relações cujo conteúdo constitui a ciência. A ideia e o conteúdo objectivo do espírito.


FILOSOFIA É PARA PLATÃO A PROCURA DO CONHECIMENTO VERDADEIRO

Liberta-nos da aparência e ilusão em que nos encontramos mergulhados
A filosofia é pensamento crítico, ensina-nos a pensarmos por nós próprios e a questionar as nossas crenças básicas

Ajuda-nos a procurar orientação para a nossa existência, a definir um projecto para a nossa vida baseado no pensamento/razão



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