Argumentos, validade, verdade e solidez

      

 

Unidade:  Racionalidade argumentativa da filosofia e a dimensão discursiva do trabalho filosófico

Temas: Tese, argumento, validade, verdade e solidez.

    



         1. O que é um argumento?




Um argumento é um conjunto de proposições que utilizamos para justificar (provar, dar razão, suportar) algo. A proposição que queremos justificar tem o nome de conclusão; as proposições que pretendem apoiar a conclusão ou a justificam têm o nome de premissas.

Supõe que queres pedir aos teus pais um aumento da “mesada”. Como justificas este aumento? Recorrendo a razões, não é? Dirás qualquer coisa como:
Os preços no bar da escola subiram; como eu lancho no bar da escola, o lanche fica me mais caro. Portanto, preciso de um aumento da “mesada”.

Temos aqui um argumento, cuja conclusão é: “preciso de um aumento da 'mesada'”. E como justificas esta conclusão? Com a subida dos preços no bar da escola e com o facto de lanchares no bar. Então, estas são as premissas do teu argumento, são as razões que utilizas para defender a conclusão.

Este exemplo permite-nos esclarecer outro espeto dos argumentos, que é o seguinte: embora um argumento seja um conjunto de proposições, nem todos os conjuntos de proposições são argumentos. Por exemplo, o seguinte conjunto de proposições não é um argumento:
Eu lancho no bar da escola, mas o João não.
A Joana come pipocas no cinema.
O Rui foi ao museu.

Neste caso, não temos um argumento, porque não há nenhuma pretensão de justificar uma proposição com base nas outras. Nem há nenhuma pretensão de apresentar um conjunto de proposições com alguma relação entre si. Há apenas uma sequência de afirmações. E um argumento é, como já vimos, um conjunto de proposições em que se pretende que uma delas seja sustentada ou justificada pelas outras — o que não acontece no exemplo anterior.
Um argumento pode ter uma ou mais premissas, mas só pode ter uma conclusão.
                                      António Padrão, Algumas noções de lógica, in Crítica





Um argumento é um conjunto de proposições* organizado de tal modo em que uma delas (conclusão) é apoiada pelas outras proposições (premissas).
Um argumento é composto por:
         Uma conclusão (a ideia que defendemos)
         Premissas (ideias que usamos para defender a conclusão)


            * proposições aqui


Indicadores de conclusão
Porque…
Logo…
Pois…
Portanto…
Dado que…
Por isso…
Sendo que…
Daí que…
Devido a…
Consequentemente…
A razão é que…
Conclui-se que…




Explicitação de argumentos
         1.       Identificar a conclusão
         2.       Identificar as premissas
         3.       Completar o argumento (caso tenha premissas implícitas)
         4.       Escrever cada uma das premissas (numa linha diferente)
         5.       Escrever a conclusão no final (a seguir à palavra “logo”)



Questões (1)
        1.     O que é um argumento?
 2.   O que distingue "premissa" de "conclusão"?
 3.   O que é uma proposição?
        2.      Explicite os seguintes argumentos:
2.1.  Todos os seres humanos são racionais, pois todos os seres humanos são pessoas e todas as pessoas são racionais.
2.2. O Pedro é licenciado porque é professor.
2.3. Sabemos que a Ana não está na praia e ela própria disse que não está a viajar. Portanto, não está de férias, uma vez que se a Maria estivesse de férias, estaria na praia ou a viajar.




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     2. Verdade e validade


A verdade é uma propriedade das proposições. A validade é uma propriedade dos argumentos. É incorreto falar em proposições válidas. As proposições não são válidas nem inválidas. As proposições só podem ser verdadeiras ou falsas. Também é incorreto dizer que os argumentos são verdadeiros ou que são falsos. Os argumentos não são verdadeiros nem falsos. Os argumentos dizem-se válidos ou inválidos.
Quando é que um argumento é válido? Por agora, referirei apenas a validade dedutiva. Diz-se que um argumento dedutivo é válido quando é impossível que as suas premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Repara que, para um argumento ser válido, não basta que as premissas e a conclusão sejam verdadeiras. É preciso que seja impossível que sendo as premissas verdadeiras, a conclusão seja falsa.
Considera o seguinte argumento:
Premissa 1: Alguns treinadores de futebol ganham mais de 100000 euros por mês.
Premissa 2: O Mourinho é um treinador de futebol.
Conclusão: Logo, o Mourinho ganha mais de 100000 euros por mês.
Neste momento (julho de 2004), em que o Mourinho é treinador do Chelsea e os jornais nos informam que ganha muito acima de 100000 euros por mês, este argumento tem premissas verdadeiras e conclusão verdadeira e, contudo, não é válido. Não é válido, porque não é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Podemos perfeitamente imaginar uma circunstância em que o Mourinho ganhasse menos de 100000 euros por mês (por exemplo, o Mourinho como treinador de um clube do campeonato regional de futebol, a ganhar 1000 euros por mês), e, neste caso, a conclusão já seria falsa, apesar de as premissas serem verdadeiras. Portanto, o argumento é inválido.
Considera, agora, o seguinte argumento, anteriormente apresentado:
Premissa: O João e o José são alunos do 11.º ano.
Conclusão: Logo, o João é aluno do 11.º ano.
Este argumento é válido, pois é impossível que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Ao contrário do argumento que envolve o Mourinho, neste não podemos imaginar nenhuma circunstância em que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Podes imaginar o caso em que o João não é aluno do 11.º ano. Bem, isto significa que a conclusão é falsa, mas a premissa também é falsa.
Repara, agora, no seguinte argumento:
 Premissa 1: Todos os números primos são pares.
Premissa 2: Nove é um número primo.
Conclusão: Logo, nove é um número par.
Este argumento é válido, apesar de quer as premissas quer a conclusão serem falsas. Continua a aplicar-se a noção de validade dedutiva anteriormente apresentada: é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. A validade de um argumento dedutivo depende da conexão lógica entre as premissas e a conclusão do argumento e não do valor de verdade das proposições que constituem o argumento. Como vês, a validade é uma propriedade diferente da verdade. A verdade é uma propriedade das proposições que constituem os argumentos (mas não dos argumentos) e a validade é uma propriedade dos argumentos (mas não das proposições).
                                              António Padrão, Algumas noções de lógica, in crítica


           a) Argumentos dedutivos - validade dedutiva


A verdade é uma propriedade das proposições
A validade é uma propriedade dos argumentos

Argumentos dedutivos são aqueles onde a conclusão é uma consequência lógica das premissas (segue-se das premissas com necessidade).
Estes argumentos pertencem à lógica formal.

Validade dedutiva:
     Forma lógica correta – a conclusão é uma consequência lógica das premissas
  Num argumento dedutivamente válido é impossível as premissas serem verdadeiras e conclusão falsa



Premissas
Conclusão
Avaliação
Verdadeiras
Verdadeira
Pode ser válido ou inválido
Falsas
Falsa
Pode ser válido ou inválido
Falsas
Verdadeira
Pode ser válido ou inválido
Verdadeiras
Falsa
NÃO PODE SER VÁLIDO



          Validade, solidez e cogência




Argumentos sólidos:
Quando argumentamos, não basta que os argumentos sejam válidos, mas interessa que as premissas sejam efetivamente verdadeiras para que a conclusão o seja, necessariamente. Um argumento sólido é um argumento válido com premissas verdadeiras.

Argumentos cogentes:
Para além de sólido, é necessário que as premissas sejam mais plausíveis que a conclusão. 
.




Argumentos válidos 
Premissas
Conclusão
ARGUMENTO SÓLIDO
Verdadeiras
Verdadeira
SIM
Falsas
Falsa
NÃO
Falsas
Verdadeira
NÃO


         

        b) Validade não dedutiva



Argumentos não dedutivos são aqueles onde a conclusão não se segue com necessidade das premissas, mas com probabilidade.

Num argumento não dedutivo válido é improvável (mas não impossível) que as premissas sejam verdadeiras a conclusão falsa
.



Questões (2)
      
            1.     Distinga argumentos dedutivos de argumentos não dedutivos.

2.     O que é um argumento dedutivamente válido?
3.     Seleciona a opção correta, atendendo à distinção entre validade e verdade.
(A)  A validade diz respeito ao conteúdo e a verdade ao contexto.
(B)  A validade diz respeito aos argumentos e a verdade às proposições.
(C)  A verdade diz respeito aos argumentos e a validade às proposições.
(D)  A verdade diz respeito à forma e a validade ao conteúdo.
4.     Qual das seguintes afirmações relaciona verdade e validade?
(A) As proposições são verdadeiras ou falsas e não válidas ou inválidas.
(B) Os argumentos são válidos ou inválidos e não verdadeiros ou falsos.
(C) Num argumento dedutivamente válido a verdade das premissas garante a verdade da conclusão.
(D) Num argumento dedutivamente válidos as premissas e a conclusão são verdadeiras.

5.     Indique as proposições verdadeiras.
(A)    Só as frases declarativas exprimem proposições.
(B)    Nos argumentos dedutivos válidos, a conclusão é uma probabilidade.
(C)   Os argumentos podem ser verdadeiros ou falsos.
(D)   A validade ou invalidade de um argumento dedutivo depende da sua forma lógica.
(E)   Há argumentos válidos com premissas falsas e conclusão verdadeira.
(F)   Um argumento dedutivamente válido tem a conclusão verdadeira.
(G)   Há argumentos válidos com premissas verdadeiras e conclusão falsa.
(H)   Um argumento é sólido se tiver premissas verdadeiras.

            6.     Qual das seguintes opções conclui corretamente a afirmação “um argumento válido…”
(A)   tem de ter premissas verdadeiras.
(B)   tem de ter pelo menos uma premissa verdadeira.
(C)   pode ter premissas falsas.
(D)   não pode ter proposições falsas.





            Texto 3 - Verdade e validade



As partes relevantes de um argumento são, em primeiro lugar as suas premissas. As premissas são o ponto de partida, ou o que se aceita ou presume, no que respeita ao argumento. Um argumento pode ter uma ou várias premissas. A partir das premissas, os argumentos derivam uma conclusão.

Se estamos a refletir sobre um argumento, talvez por termos relutância em aceitar a sua conclusão, temos duas opções. Em primeiro lugar, podemos rejeitar uma ou mais das suas premissas. Em segundo lugar, podemos também rejeitar o modo como a conclusão é extraída das premissas. A primeira reação é que uma das premissas não é verdadeira. A segunda é que o raciocínio não é válido. É claro que o mesmo argumento pode estar sujeito a ambas as críticas: as premissas não são verdadeiras e o raciocínio aplicado é inválido. Mas as duas críticas são distintas (e as duas expressões, «não é verdadeira» e «não é válido» marcam bem a diferença.

 No dia-a-dia, os argumentos também são criticados noutros aspetos. As premissas podem não ser muito sensatas. É uma tolice apresentar um argumento intrincado a partir da premissa de que eu vou ganhar a lotaria da próxima semana se não houver qualquer hipótese de isso acontecer. É muitas vezes inapropriado recorrermos a premissas que sejam, elas mesmas, controversas. Não revela qualquer tato nem é de bom gosto argumentar a favor de certas coisas em certas circunstâncias. Mas «lógico» não é sinónimo de «sensato». A lógica interessa-se em saber se os argumentos são válidos, e não se são sensatos. E vice-versa, muitas das pessoas a que chamamos «ilógicas» podem até usar argumentos válidos, mas que são patetas por outros motivos.

A lógica só tem uma preocupação: saber se não há maneira de as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa.

                            Simon Blackburn, Pense, Uma Introdução à Filosofia





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